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No Olhar de Olga

“É fácil viver a vida dos homens comuns. Difícil, minha filha, é viver no submundo”, diz a moradora de rua Olga, enquanto é despejada de uma casa que ocupou por um tempo com outros quatro sem teto.

Enquanto recolhe o shampoo do banheiro ela, que já foi professora de português e línguas, olha para as policiais femininas e questiona: “Como é ser guarda? Anjo da guarda? Vocês também guardam por mim?”.

Recolhe o cobertor delicadamente dobrado sobre a cama de papelão, a cama fria não é tão gelada quanto o olhar atento dos donos do imóvel, que antes da ocupação vivia abandonado.

Seu companheiro de rua recolhe a cebolinha que plantou num vasinho preto na janela. Olga tem vontade de chorar, mas não pode. “Na rua a gente é forte porque não tem opção de ser fraco”.

As policiais estão paralisadas, cada uma na porta de um cômodo, Olga olha para elas e com perfeita afinação canta:

Os anjos de onde vem sua vida bem-vinda
... os livros não são sinceros
Quem tem Deus como império
No mundo não está sozinho

Recolhe a panela na pia, de uma casa que não estava suja, parecia mais uma república, só o almoço ficou por fazer. Foi despejado da mesa como Olga despejou-se de si. “Viver o lado escuro da vida..., é preciso coragem para não ser nada e não ter ninguém”.

Érica Alcântara

Em algum mês de 2015

 

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