Pular para o conteúdo principal

A soltura dos Barrabás


Desde os tempos de Jesus libertamos Barrabás.
Em algumas filosofias acredita-se que o ser humano em sua espiritualidade só consegue evoluir depois de passar por um período de provação. Enquanto não se aprende a lição por um determinado erro, o universo colocará a sua frente as mesmas purgações, até que se aprenda e se desenvolva para a próxima etapa da evolução.
Se compararmos a existência humana a um jogo de vídeo game, possivelmente não saímos da primeira etapa. Visto que nosso calendário passou a contar quando Jesus nasceu, de lá para cá pouca coisa aconteceu (?), o cenário é outro e os recursos também. Mas moralmente, eticamente, continuamos a libertar Barrabás, identificado nos evangelhos como salteador e assassino.
Podem alguns dizer que a lista infindável de corruptos não envolve assassinatos. Será que não? Mesmo que todos os delatores, de hoje e do início da presepada, nunca tenham sido ameaçados ou mortos, lá na ponta sempre haverá outra lista infindável de falecidos, aqueles que não têm mais direito a voz, nem ao aprendizado, que padeceram desamparados nas filas de espera do SUS – Sistema Único de Saúde, nas estradas capengas cheias de buracos, nas tribos abandonadas, na seca que nunca acaba, na miséria que mantém a fome que nunca se sacia...
Mesmo que o corrupto nunca segure em uma arma e atire nas costas de um indefeso, desde o início dos tempos, os desentrelaçares de suas falcatruas matam mais que bombas atômicas. Porque são mortes veladas por uma sucessão tão profunda e antiga de erros que já não se sabe mais a origem e o peso de cada desvio de conduta.
Nesta semana, quando o Supremo Tribunal Federal concedeu a soltura ao ex-ministro José Dirceu, parte da água da Lava Jato endureceu, calcificando a desesperança na Justiça, já tida como cega e portadora de déficit de ação.
Para a ciência, a água dura (rica em cálcio e magnésio) dificulta a ação dos sabões na remoção da sujeira. Na Lava Jato, o que a soltura do ex-ministro realmente significa? Que a água é dura e os tempos são de moral mole?
Fato é que ao anunciarem seus votos, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes tornaram mais dura a crença de que seremos um dia capazes de superar a primeira etapa deste jogo da vida. 

Talvez no fundo mesmo, o ser humano não tenha sido criado para viver em comunidade, por que há milênios dá provas de que pensa primeiramente na individualidade e, para piorar, menospreza que por detrás de interesses políticos e de poder, sempre haverá algum inocente crucificado.

Texto publicado no Jornal Ouvidor, ed. 1123, 06/05/2017

Comentários

Postar um comentário

O que eu penso disso...

Postagens mais visitadas deste blog

Até você vir

 Até você vir  O vento era tudo Que ia, que vinha  Até você vir O tempo passava Eu o sentia, lânguido Agora tudo é brisa O tempo desliza Suaves rompantes Coram-me a face Cartas ridículas Cartas eróticas Seu corpo pálido Minha pele morena Seu corpo nu Minha alma despida Érica Alcântara

Isabelense é inocentado após 17 meses de prisão

“A esperança de voltar para minha família me manteve vivo”, disse David João Nunes Inácio por Érica Alcântara David João Nunes Inácio fez questão de começar a sua entrevista na quarta-feira, 23/10, dizendo: “Eu sou isabelense, nasci aqui, trabalhava aqui e não quero deixar esta cidade”. Em abril de 2018 ele foi preso, acusado de participar de um crime que, em dezembro de 2015, ceifou a vida da professora Maria Helena de Oliveira Godoi, assassinada na cidade de Redenção/Pará. Após 541 dias preso, o Juiz de Direito do Pará, em auxílio à Vara Criminal de Redenção, Dr. José Torquato Araújo de Alencar absolveu David de todas as acusações em face da falta de provas. “Não guardo revolta, só a vontade de voltar para minha vida”, diz. O Processo No dia 24/04/2018, David foi preso quando saía do trabalho na Secretaria de Serviços Municipais. Ele ficou preso alguns meses em São Paulo, depois foi transferido para o Pará onde ficou sete meses sem ver a esposa, Luciene Cristina

O peixe morre pela boca e nós também

Por Érica Alcântara Agora que a pandemia amenizou estamos mais à mostra, presencialmente à mostra. E que mensagem estamos transmitindo? Que código silenciosa meu corpo passa quando, sem nenhuma palavra, caminho na direção de um estranho. A porta da escola voltou a formar fila de espera para entrar. Por aqui os uniformes são vermelhos da cor do tomate, beeeem vermelhinho e, observando melhor, a maioria das crianças tem mesmo um formato de tomate do tipo caqui. Bem redondinho. Quando eu era criança ser gordinho era sinônimo de saúde, é como se a criança gordinha simbolizasse uma casa repleta de fartura. As crianças magras eram obrigadas a tomar tônicos e aqueles elixires “de crescimento”, tudo para abrir o apetite que, para muitos depois de abrir, nunca mais fecharam... Mas aí, chega um dia em que ser gordinho deixa de ser símbolo da saúde e passa a ser motivo de escárnio, chacota para os estranhos e, muitas vezes, para os parentes mais inconvenientes. Reportagem R7: https://bity