Pular para o conteúdo principal

Quem tira o lixo do seu banheiro?




Um dia uma amiga me contou que sua mãe não a deixa ter um cachorro em casa. Eu perguntei a ela, qual foi a última vez que você tirou o lixo do banheiro?
O quê? Mas o que isso significa?
É simples, se você não se lembra de tirar o lixo do banheiro, não cuidará da sujeira do seu cachorro – respondi.
Passei os últimos dias trabalhando em casa, sempre detestei o serviço doméstico e com certa distância admirava as mulheres que fazem isso com naturalidade. Em parte, penso que essa espécie de complexo de princesa (termo que acabei de criar) herdei de minha mãe, que sempre fez de tudo, mas nunca foi amante da terminação “do lar”.
Por outro lado, acho que o problema é que ninguém se dá conta do valor deste trabalho até que a sujeira esteja instalada, como nas cidades de todo o país em que o pior salário é de quem limpa ou recolhe o lixo das ruas. E a maior parte dos varredores, coletores de lixo passam a vida invisíveis aos olhos da maioria dos indivíduos.
Nestas minhas férias, em que estou intensamente voltada para a casa, me lembrei de como a simples tarefa de retirar o lixo do banheiro e lavar a louça todos os dias exige um alto grau de desprendimento. Por que não interessa se estamos cansados, se queremos ler um livro, se preferimos comer fora, ou sair para tomar banho de sol – as coisas continuarão esperando que você melhore/mantenha o ambiente que você vive.
Mas as tarefas diárias, aos poucos ficam automatizadas e somos tragados por um turbilhão de pensamentos, desde como zelamos por nosso espaço a como o ser humano se define na forma como ocupa um espaço.
Eu revisitei os lugares ocultos da casa, como revi os labirintos de meu ser. Ainda estou jogando fora todos aqueles papéis que se acumularam com o tempo, como a amargura que não me pertence.
Estou enfrentando as paredes sujas e abrindo as janelas de minh’alma. Estou mesmo com o corpo cansado, lixando o velho, raspando o passado e colorindo o presente.
Interessante, quando ganhamos algo de alguém chamamos a coisa (seja ela o que for) de presente. Para mim, o ser humano tem certa dificuldade de ser feliz por completo, porque somos dotados de memória, então estamos atrelados demais ao passado tentando nos preparar para não sofrer no futuro. Talvez seja por isso que chamamos de presente o tempo de agora, por que ganhamos a oportunidade de viver este momento, como coisa nova por fora, como coisa real por dentro.
Filosofia do lar? Talvez. 
Arrumar a casa é cortejar o melhor de nós mesmos.

Publicado no Jornal Ouvidor em janeiro de 2014

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Até você vir

 Até você vir  O vento era tudo Que ia, que vinha  Até você vir O tempo passava Eu o sentia, lânguido Agora tudo é brisa O tempo desliza Suaves rompantes Coram-me a face Cartas ridículas Cartas eróticas Seu corpo pálido Minha pele morena Seu corpo nu Minha alma despida Érica Alcântara

Sobre a prova de Deus

Setembro de 2004, sentada na varanda de casa reflito sobre Deus.  Mais ainda, penso nas instituições que garantem representá-Lo. Me calo. O Deus por muitas delas defendido é sempre condicionado, por-Tanto, há sempre um preço a pagar.  E o amor nestes termos perde a pureza original, tem preço com QrCode no final. A dura verdade, a verdade mais difícil de digerir é que no fundo-no-fundo não dá para provar a existência de Deus, porque as provas concretas o reduzem a condições limitadas à nossa própria existência. Reduzir o divino é tirar de Deus sua onipotência, é transformar o Criador na própria criatura. Érica Alcântara

Isabelense é inocentado após 17 meses de prisão

“A esperança de voltar para minha família me manteve vivo”, disse David João Nunes Inácio por Érica Alcântara David João Nunes Inácio fez questão de começar a sua entrevista na quarta-feira, 23/10, dizendo: “Eu sou isabelense, nasci aqui, trabalhava aqui e não quero deixar esta cidade”. Em abril de 2018 ele foi preso, acusado de participar de um crime que, em dezembro de 2015, ceifou a vida da professora Maria Helena de Oliveira Godoi, assassinada na cidade de Redenção/Pará. Após 541 dias preso, o Juiz de Direito do Pará, em auxílio à Vara Criminal de Redenção, Dr. José Torquato Araújo de Alencar absolveu David de todas as acusações em face da falta de provas. “Não guardo revolta, só a vontade de voltar para minha vida”, diz. O Processo No dia 24/04/2018, David foi preso quando saía do trabalho na Secretaria de Serviços Municipais. Ele ficou preso alguns meses em São Paulo, depois foi transferido para o Pará onde ficou sete meses sem ver a esposa, Luciene Cristina